Foto: http://www.telegraph.co.uk/sport/olympics/paralympic-sport/9518078/Oscar-Pistorius-could-have-run-with-longer-blades-at-the-Paralympics-says-prosthetics-supplier.html
Pistorius ficou conhecido
mundialmente por ter lutado pelo direito de competir em provas convencionais,
mesmo fazendo o uso de próteses. Vitorioso nos tribunais, participou do
Campeonato Mundial de Daegu e dos Jogos Olímpicos de Londres.
A decisão da Corte Arbitral do
Esporte é contestável, pois não se ateve às regras da modalidade nem aos
resultados dos estudos já disponíveis na época, que mostravam que um atleta
bi-amputado utilizando próteses de fibra de carbono poderia ter uma vantagem
substancial sobre atletas com membros inferiores íntegros, ao menos na prova
que era a especialidade de Pistorius, os 400m rasos.
Todos aqueles que tiveram a
oportunidade de assistir Pistorius correndo contra atletas convencionais
testemunharam que duas provas distintas ocorriam na pista ao mesmo tempo.
Embora o sul-africano mostrasse bastante dificuldade para acelerar nos trechos
iniciais da prova, sua velocidade continuava aumentando por mais tempo, e se
mantinha alta até quase o final. Por vezes, como jamais ocorreu com qualquer
outro atleta de nível internacional, era capaz de fazer a segunda metade dos
400m mais rápido que a primeira, apresentando uma frequência de passadas maior
que a vista em corredores de 100m de elite mundial!
A necessidade de responder à
sociedade com uma decisão que pudesse ser considerada politicamente correta fez
com que o sul-africano, e consequentemente qualquer outro atleta nas mesmas
condições, fosse liberado para participar de provas convencionais, sem
considerar que avanços tecnológicos e o natural surgimento de indivíduos
amputados com maiores habilidades atléticas pudessem teoricamente – em algum
momento – tornar esses atletas quase imbatíveis em relação àqueles com membros
íntegros.
No excelente blog “The Science of
Sports”, os também sul-africanos Ross Tucker e Jonathan Dugas discutem
amplamente o caso de Pistorius, e também do brasileiro Alan Fonteles, (http://www.sportsscientists.com/thread/oscar-pistorius/).
Uma reportagem apresentada na
manhã desse domingo deixou a impressão que a pergunta do início do programa
havia sido respondida: Fonteles estaria obtendo resultados quase do nível dos
atletas convencionais por seu talento atlético, e não pela tecnologia das
próteses. Nenhum dos testes apresentados pode dar suporte a esse tipo de conclusão.
Seguem alguns comentários:
1. Em
qualquer investigação para determinar se as próteses conferem vantagem para os
indivíduos que as utilizam, a pergunta a ser respondida é: caso o atleta em
questão tivesse membros intactos, ele seria capaz de produzir os mesmos
resultados? A comparação entre indivíduos é pouco relevante nesse caso, pois
não consegue determinar o que é intrínseco ao atleta e o que é efeito direto da
prótese. Em outras palavras, Alan Fonteles correu os 100m em 10.57 e os 200m em
20.66 APESAR das próteses, ou POR CAUSA delas?
2. Atletas
convencionais buscam efetivamente aplicar o máximo de força contra o solo no
menor tempo possível. O fato de Alan Fonteles ter produzido tempos de contato
maiores foi visto como uma desvantagem das próteses. Poderia ser apenas uma
limitação individual, mas já ficou bem demonstrado em outras investigações que
isso ocorre com praticamente todos os bi-amputados, que compensam essa aparente
desvantagem com uma frequência de movimentos absurdamente alta;
3. Testes
de saltos com saída parada dão uma boa estimativa de uma manifestação da força
muscular chamada por alguns autores de força explosiva. No entanto, não são
específicos para provas de velocidade, onde na maior parte do tempo outra
manifestação, chamada de força reativa, é necessária e guarda maior relação com
o desempenho. Testes de saltos repetidos (preferencialmente com apoios
alternados ou sequenciais, ao invés de simultâneos, e horizontais ao invés de
verticais) poderiam lançar mais luz nessa discussão. A curva de fadiga em
testes desse tipo também poderia trazer informações interessantes;
4. Atletas
usuários de próteses podem “crescer” de uma competição para outra, dentro dos
limites impostos pelo Comitê Paralímpico Internacional. Os atletas testam
diferentes comprimentos de prótese, buscando aquele que lhes permita otimizar o
desempenho (não tão longas a ponto de comprometer muito a saída e o controle da
corrida na curva, e não tão curtas a ponto de comprometer a velocidade máxima e
sua manutenção). Os limites estabelecidos pelo IPC parecem ser bastante
generosos, pois tanto Fonteles quanto Pistorius competem com alturas bastante
inferiores ao que lhes é permitido. Obviamente, indivíduos adultos com membros
íntegros não têm essa possibilidade, e podem contar apenas com o treinamento.
Alan Fonteles e Oscar Pistorius
são atletas paralímpicos excepcionais que merecem todo o respeito por suas
conquistas. Foram capazes de encontrar a motivação para, apesar das
adversidades, buscarem a realização de seus sonhos. Competindo em condições
iguais, se tornaram os melhores do mundo naquilo que fazem. Mas correr com
próteses é tão diferente de correr com os membros íntegros quanto de “correr”
com cadeira de rodas... São condições completamente distintas, que não são comparáveis
entre si.

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